Quando Dan Gardner subiu ao palco e declarou que “a indústria está em uma corrida para o fundo do poço”, todos na sala (pelo menos eu) se perguntaram o porquê. Gardner trouxe uma perspectiva que contradizia o hype do evento. Na ânsia de transformar a IA no motor supremo da eficiência, líderes executivos estão a cometer um erro que custará o futuro dos seus negócios.

Atualmente, vivemos uma obsessão coletiva pela produtividade e pelos cortes de custos. A apresentação do ex-CEO da Code and Theory nos faz questionar se estamos a otimizar as coisas certas, porque, se não estivermos, estamos apenas a acelerar a queda.

No estudo "The Experience Gap" (Code and Theory com WSJ Intelligence), 94% dos executivos afirmam que a Experiência do Cliente (CX) é o que impulsiona o sucesso. No entanto, 93% admitem que a sua própria experiência digital está "partida". É a definição perfeita de uma inconsistência cognitiva: sabem exatamente o que devem fazer, mas não agem.

Qual seria o motivo? Décadas de sistemas e processos desenhados para servir as empresas, não as pessoas. A IA, em vez de ser o catalisador da mudança, está muitas vezes sendo usada para manter o status quo desta arquitetura partida. Gardner alertou que estamos simplesmente “automatizando erros existentes mais rapidamente”. E há um custo invisível que não aparece nos dashboards tradicionais: poupar dinheiro enquanto se perdem clientes.

E a história se repete: empresas celebram ganhos operacionais enquanto os seus custos de aquisição disparam. Estamos medindo o ROI quando deveríamos medir o ROR (Return on Relationship).

Aqui está o ponto fundamental: "Brand and Experience is One”. A marca já não é o que a empresa comunica, é o que o cliente sente em cada interação.

Existe um paradoxo curioso: 86% dos líderes afirmam que CX será a sua maior prioridade de investimento nos próximos anos. Ou seja, a consciência existe, só falta coragem para romper com a lógica da eficiência a qualquer custo.

Gardner é claro: isso "requires new measurements". O ROI mede quanto cortamos, já o ROR mede quanto crescemos. É a diferença entre gerir o trimestre ou gerir a década.

O ROR (Return on Relationship) é a métrica que captura o valor acumulado das relações ao longo do tempo: confiança, lealdade e advocacy.

Componentes do ROR incluem:

·      Retention Rate Premium: Os clientes ficam mais tempo que a média?

·      Effort Score Reduction: Ficou mais fácil ser cliente?

·      Advocacy Multiplier: Os clientes trazem novos clientes?

·      Trust Index: Quanta informação é partilhada voluntariamente? 

Para base de comparação, segue:

Métrica

Foco

Horizonte (tempo)

Resultado

ROI

Eficiência

Trimestral

Custo reduzido

ROR

Relação

Anos

Valor ampliado

A Lovable é um exemplo que merece atenção justamente porque contraria a narrativa dominante. A empresa conseguiu escalar sem perder o toque humano, não porque escolheu entre eficiência e experiência, mas porque uniu as duas. A fórmula é simples: IA para velocidade, humanos para empatia. Automação nos bastidores, personalização no front.

Os tempos da experiência descartável está acabando. Gardner descreve esse conceito como “the internet is closing”. Os usuários já não toleram interações desumanizadas.

Portanto, no final, tudo se resume a utilizar a inteligência artificial para aproximar, não afastar as pessoas. As empresas que fizerem essa escolha simples serão as que continuarão a ter clientes nos próximos anos.